domingo, 19 de setembro de 2010

A MARATONA

Faz quase um ano corri a minha primeira e única maratona até hoje. Vem isto a propósito de ter assistido ao Campeonato da Europa de Atletismo em Barcelona. Enquanto decorria a prova da Maratona, o comentador (por sinal excelente) ia fazendo o retrato possível do estado de alma e físico daqueles homens que corriam a prova mais dura a que se pode submeter um ser humano, ele ressaltou que hoje se fazem provas de maior distância, mas , aqui está o cerne da questão, na Maratona existe ainda o factor de razoabilidade de submeter o corpo a um esforço que vai o limite, sem passar o mesmo e mantendo níveis de performance elevados, o que não acontece a partir dessa distância.Olhando os atletas, com uma feição de enorme esforço, veio-me á memória as minhas quatro horas e meia de corrida para fazer o percurso de 42 km. Aqueles homens preparam-se afincadamente para fazer esta prova, conheço um dos atletas Portugueses, Alberto Chaiça, sei da facilidade que ele treina e corre, mas em Barcelona vi bem espelhado no rosto dele, no final da prova, o esforço e a dor. Um atleta Francês que até meio da prova parecia fresco que nem um repolho, a meio da prova começou a dar sinais de cansaço e acabou mesmo por desistir. Dizia o comentador que durante o percurso estes homens passam por vários estádios, sofrimento, cansaço, dor, e psicologicamente é uma catadupa de estados de alma, sendo aí que o atleta tem que fazer, muitas vezes, das tripas coração, isto é tem que procurar no mais recôndito lugar as forças para não desistir, não sentir aquela dor que o incomoda, o sentimento de impotência perante uma distância que já ultrapassou os 30 km e parece que de repente as forças todas faltam…
Estamos a falar, quem participou na prova, de atletas profissionais, indivíduos que fazem da corrida o seu dia a dia.
Imagine-se agora o cidadão comum que corre apenas pelo prazer de partilhar alguns momentos com companheiros e ao mesmo tempo melhorar a sua qualidade de vida através da corrida e começa a pensar em fazer uma maratona. Em Portugal a lista ainda não é longa de atletas de pelotão que fizeram a mítica distância, tenho orgulho em ter feito pelo menos uma e ter, como amigos e conhecidos, vários atletas de pelotão que já fizeram uma ou mais, sendo que um deles irá completar em breve a sua trigésima maratona ( sim, 30 vezes 42 km, façam a conta).
A minha experiência na maratona foi arrasadora, literalmente, fiz 32 km a sentir-me razoavelmente, mas a partir desta distância foi um calvário os músculos cederam surgiram as caibriãs e o meu estado físico passou, num ápice, de razoável a sofrível. Tudo se desmoronou, o meu estado psicológico ficou de repente arrasado tal como o físico, faltava força, faltavam forças. A tentativa de correr mais um pouco era uma epopeia comparada a carregar um peso enorme por uma montanha acima. Sou por natureza persistente e tenho muito , penso eu, espírito de sacrifício, e com dificuldade acabei por não desistir e impor-me a mim próprio a obrigação de terminar aquela prova, desse por onde desse. Andei, nem sempre corri, nesses últimos 10 km, mas isso em nada menoriza o feito de a terminar, pois já ouvi muita gente dizer qualquer coisa do género, “ eu para ir , tenho que ir fazer o tempo x ou o tempo y …”, eu direi, vão , que esse tipo de comentário apenas serve para ocultar o medo de falhar, é preciso é ir e fazer, depois dizer, valeu a pena todo este sacrifício, esse é o grande prémio.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Correr no colectivo

13ª Estafeta do Bairro Alentejano-Palmela

Á semelhança dos dois anos anteriores, em finais de Maio, rumei ao Bairro Alentejano na zona de Palmela, para participar na estafeta, após a minha primeira prova na estafeta, interrogava-me o porquê de lá voltar.
É uma prova rápida, curta para atletas pouco rápidos como eu, está calor, afinal que me faz lá ir há três anos consecutivos.
Pensei, será porque as minha raízes são Alentejanas, será essa simpatia e afinidade, será porque se estabelece o compromisso com mais três amigos que contam comigo para fazer a equipa? Hoje dissipei todas estas dúvidas. Habitualmente terminada a prova rumava a casa.
Nesta prova existe ,oferecido pela organização aos atletas, um almoço após a mesma. Nunca lá fiquei, este ano, inicialmente, pensei em ter a atitude dos anos anteriores, não me meter em confusões e sair dali para casa, mas em boa hora mudei de ideias e decidi ficar. Digo em boa hora, porque o ficar permitiu-me entender a essência da prova e saborearum simpático almoço.
Vamos por partes: almoço excelentemente confeccionado, umas febras com uma salada e um arroz de cenoura excelente, sumo de laranja (no meu caso) ou vinho á descrição. O que parecia ir demorar tempo para que fossem servidos os almoços, verificou-se errado, em menos de 45 min estavam sentadas á mesa centenas de pessoas a saborear o repasto.
Self-service ( em português, vai tu buscar o prato) rápido, comida q.b., simpatia de quem servia, excelente.Logo ali deu para perceber o que está na essência desta prova, o colectivismo ou esforço conjunto das pessoas para um objectivo comum, dar a quem vai participar e acompanhar a prova motivos para sair dali a pensar vale a pena voltar, o tratamento é excelente. Intrigava-me o tipo de prova, mais de 21 km, dividos por 4 atletas, porquê esta formato de prova, que acaba por ser original, eu pelo menos não conheço mais nenhuma do género, excepto a maratona de Lisboa que faz estafeta do mesmo género na distância, mas só há 2 anos.
Agora entendo a prova, representa o espírito que preside á Colectividade do Bairro Alentejano em Palmela, ou seja, o colectivo é que importa, a prova prolonga esse espirito e incentiva-o, é um colectivo que faz a prova, esforço conjunto para obtenção do resultado. E mais ainda , todo o esforço para proporcionar aquele repasto é feito num acto voluntário, pessoas que se levantam de madrugada para começar a prepará-lo. É um Portugal que me lembra o associativisto, as colectividades que vão desaparecendo, onde a moda do cattering (mais um estrangeirismo) ainda não se tinha imposto. Havia identidade, e no Bairro Alentejano
em Palmela essa identidade ainda é uma realidade.Hoje começa a dissipar-se este tipo de esforço colectivo,aqui encontrei um belo exemplo de que ele ainda existe. E mais, é muito válido e cativa,por isso para o ano vou voltar, não porque sou Alentejano, mas porque me cativou este espírito. E mais posso afirmar que são dos mais generosos nas oferendas, tendo sempre o cuidado de oferecer até ás 60 primeiras equipas um troféu, bem como a uma tshirt aos participantes.
Por vezes ainda reconheço este país, ainda existe identidade, este é um belo exemplo.

domingo, 2 de maio de 2010

Correr contra o vento...de maré...

                       (foto de Nuno Fernandes em TREKEART)

Correr a favor do vento representa um acto de bondade, sentimos a "mão" amiga que nos ajuda a rolar ,termo que significa correr sem sentir qualquer dificuldade, ir numa espécie de velocidade de cruzeiro.
Faço parte de um grupo de previligiados que morando perto de uma praia podem nela correr quando a maré está vazia, isto é , na baixa-mar. A Costa da Caparica têm uma extensão de areal sem interrupções, quer naturais ou construídas pelo homem, que fazem dela um caso único, estende-se o areal com características para correr, porque a areia fica dura  não solta, durante cerca de 10 km, desde a Costa da Caparica até á Praia da Fonte da Telha.  Este percurso é magnifico, a paisagem, como se imagina, é  mar de um lado e a Arriba fóssil do outro, e depois todo aquele extenso areal que se prolonga até ao Meco. Sendo que após passar a Fonte da Telha se torna mais problemático até á Lagoa de Albufeira, por isso a corrida, na maioria das vezes, só se estende até um local denominado a Mina,  eu costumo ficar pelo terminal da Fonte da Telha, aí dou a volta para regressar á Costa da Caparica.
     Feito este intróito para colocar no centro das atenções o vento, e localizar o local onde este se manifesta , vamos aos factos. Neste ambiente magnifico treino habitualmente de 15 em 15 dias, altura em que a maré o permite. O vento é uma companhia muitas das vezes e como escrevi de início, bondoso quando nos "empurra" com a dita "mão" invisivél (não do Adam Smith). Mas não há bela sem se não! Esta bondade seria extrema se nós, eu e os meus amigos, fizéssemos a corrida num só sentido. Mas a factura espera por nós na volta. Feito meio percurso viramos e de repente parece que veio contra nós uma barreira, tal a força do vento, que nos empurrra teimosamente para trás...Quando o vento é proveniente do Norte...valha-nos pernas e força, aquilo que foi feito a rolar e com a dita bondosa ajuda  é depois feito de um esforço quase equiparavél ao da subida de uma montanha com alguns km. Parece que uma parede se abate sobre nós, pode-se atirar o corpo para a frente que ele não cai... e não estou a exagerar, o percurso de cerca de 9 km é feito de uma persistência quase titânica.
     Imagine-se um vento constante se cerca se 60 km hora a vir contra nós , e nós a correr-mos contra ele com uma velocidade de cerca de 12 km hora, o embate é desigual...mas sentimos a satisfação de conseguir vencer aquela barreira e quando chegamos, aqueles que o conseguem, fica-nos a sensação que corremos numa dimensão paralela, onde o embate do corpo se prolongou e estendeu para lá de nós...quando começamos a andar no sentido contrário vêm a bonança...a corrida proporciona sensações que se pode dizer, únicas, é nestas que reside algum do seu prazer para além de outros.

domingo, 4 de abril de 2010

Constância…Vila Poema


Vila poema como é designada por quem nela habita, Constância revela-se poesia viva para os olhos. O que sobressai da sua bela paisagem e localização é um autêntico poema vivo. Camões aportou ou terá por ali nascido, diz-se, mas mesmo sem o apoio do mesmo, Constância seria por si só suficiente para encantar. Imagine-se em Constância um quase ambiente Medieval onde um Cavaleiro Andante, agora numa versão de atleta, alguém que corre…que cruzasse a meta para assim cumprir o desígnio que ali se iniciava e cujo fim não se determinava, acontecia simplesmente.


A prova tem um percurso que faz jus a toda a envolvência de Constância, ela, prova, é, por si mesma, uma ode á corrida. Partindo junto ao jardim onde predomina a junção de dois rios, onde vêm desaguar o Zêzere, num encontro amigável com o Tejo, o mais emblemático dos nossos rios, começa por apanhar logo uma subida para aí com 400 metros e uma inclinação razoável. Mas depois vêm o melhor, começamos a correr paralelamente ao Zêzere, e este será nossa companhia ao longo do percurso, onde se vislumbra a escarpa que o rodeia com o verde das árvores a dar o tom às várias tonalidades que têm o rio. Paisagem bonita a primeira metade da corrida é feita quase, pelo menos, é a ideia inicial, toda a descer. Mas o mais enigmático, ou não, é que Constância quer encantar e por isso quando damos a volta aos 5 km e iniciamos o percurso de volta á Vila, o terreno que nos parecia que iria ser a subir revela-se quase plano e com um grau de dificuldade mínimo, exceptuando quase a chegar á entrada de Constância onde é mais íngreme, para logo apanhar-mos a descida para a meta, cabe aqui a nota á chuva que só surpreendeu no fim, mantendo o percurso de forma fresca mas sem cair, pese embora o céu cinzento.

Tal como já me seduziram outros percursos de provas, este encantou-me, é uma prova que encanta, nos coloca num ambiente tranquilo, bucólico…inspira á poesia, vai ficar no calendário como uma prova a repetir e, a quem nunca a fez, aconselho vivamente.

A organização excelente, merece mesmo uma menção especial, percurso excepcional, abastecimento q.b. e mostram-se gentis nas ofertas, o saco “recheado” e um troféu a mostrar a generosidade das Gentes e da Vila Poema, selam uma prova de eleição.

Uma palavra para a Ana Paula que tem um blogue com o título “alémvirtual”, cruzei-me por lá com a sua estrela ao peito, fiquei feliz, vi de longe o local onde repousa a sua Estrela…brilham as duas, parabéns Ana Paula.

Fica um pequeno excerto de um post colocada no blogue da Ana Paula onde se refere á sua filha Margaret; “Há passos não percorridos. Passos interrompidos. Passos em forma de sonho. De um sonho ainda mais simples que um passo. O sonho de "estar de pé"´(o dela).”

Concordo plenamente, não são precisas mais palavras!

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Porquê mais…treino á chuva…

O Mar da Costa da Caparica deu-me as boas vindas. Ondas revoltas, recente cemitério de pescadores, o mar da Caparica fascina mas impõe respeito…quando se manifesta, exige a contemplação da sua graciosidade misturada com a grandeza da sua força.

Eu e os meus companheiros fizemo-nos ao pontão da Caparica, paralelamente o mar fazia a sua corrida. Há dias em que juntamos grupos homogéneos para correr, quer na parte de ritmo, toda a gente tem o mesmo, quer na cavaqueira sobre os mais diversos temas. Sobre o denominador comum das lesões – acontece a quem corre, mas debelam-se – juntámo-nos para fazer um treino, quase, de terapia. Feito o primeiro km já a conversa ultrapassava o ritmo das nossas pernas. Lançou-se o tema, que leva alguém que, aparentemente, tem tudo a procurar, ou querer, mais?

Interpretações várias, deu para perceber que nem todos temos a mesma visão sobre o tema, alguns olham a poesia da coisa…até a correr há poesia, outros pintam a tons monocórdicos, normalmente cinzento, o tema. Será que tem a ver com a vida…onde se descobre onde ela começa? Parece mais fácil dizer que ela tem um fim, como limite…não um fim como procura….tudo seria mais fácil se a nossa cabeça não complicasse. Mas há pessoas que vieram para dar cor á vida, outras vieram daltónicas, mesmo com as cores todas escarrapachadas….só vêm o cinzento. Postas as coisas, começámos a deambular pelo tema…divagar seria mais adequado, mas devagar já nós íamos. Vai daí, vêm á baila o, Vickie Cristina Barcelona de Woody Allen, a personagem de Juan António, pinta as telas com a mesma intensidade com que pinta a vida…pouco tempo passado sentia-se a corrida através da poesia..do sentido poético da vida…e como foi agradável, perceber que através da corrida também se fazem pistas de poesia, fundadas nas letras e a alicerçadas na vida.

No fim corremos uma hora e sete minutos, apanhámos uma chuvada, fomos saudados por um sol a querer irromper na praia e vimos alguém que, por azar, deixou o carro mal travado (não o nosso) e foi parar ao mar na Cova do Vapor…há dias assim, completos… mas que leva alguém a quer mais, a interrogação ficou no ar.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A Corrida acto de terapia

Vou treinar para ao Parque da Paz, levo o meu MP3 e ouço música enquanto corro, casamento perfeito entre o prazer de correr e a música que vou ouvindo.

Calço as sapatilhas, final de tarde quase a escurecer. Dia cinzento chuvoso, frio que obriga a um reforço do vestuário.
Inverno, chuva, frio, quase noite…vou só, que me leva a correr , que faz com que este acto, a corrida, tenha tal importância que me leve a abdicar do conforto do quente da casa, para me aventurar na rua no ar livre e frio de um dia de inverno?
 Este acto tem tudo! A corrida, em marcha lenta ou moderada, é para mim um momento de prazer, puro prazer…o corpo cansado, a alma confortada e a mente limpa, são os sentimentos que me ficam depois de correr. Hoje consegui aquilo que há muito tentava, correr só, e ouvir música, aliar esses dois prazeres, que tinha adiado várias vezes em virtude de quando vou correr ter, por norma, companhia para conversar e conviver durante o decurso e curso da corrida.

Coloquei os fones nos ouvidos, olhei o caminho, o manto o negro da noite começava a cobrir o Parque da Paz ( local onde corro ) , não se via viva alma, só eu , os meus fones e a minha respiração. Foi sublime, a música começa a soar, nada mais ouvia…foi uma fusão perfeita, o casamento perfeito entre estes dois prazeres que tenho…aconselho vivamente.
                                              (Foto de Maria Salvador ,em olhares.com) 

Á minha frente os caminhos  estreitos pareciam ser tapetes onde podia quase planar ou escorregar… o som dos Massive Attack balançava-me o corpo…corria, corria sem sentir as pernas…o meu cérebro recebia todo aquele prazer transmitido pelos meus sentidos, quer pelo esforço físico quer pelo apelo sensitivo da música. Faço da corrida um acto de prazer, entre outros prazeres, tem sido nos últimos anos uma “terapia” para mim. No correr expio os meus males, regenero-me após cada corrida…e se uma não chega aumento o tempo , transformando-a em duas se necessário. Agora que descobri este novo aliado, presente da minha filha no Natal, encontrei a fórmula perfeita para a minha terapia ao fim do dia. Munido do Mp3 ou 4, ainda não sei, vou sem temores enfrentar qualquer distância…10, 15 ou 21 km, venham eles, cá os espero com os Massive Attack, Peter Gabriel, David Bowie e os GNR ( os músicos..é claro) ,termino com o “Bem vindo ao passado” destes , parecendo ser o pronuncio de um passado em que não tinha ainda encontrado esta fórmula, corrida e música…só ouvia música e acompanhado…por vezes mal, mas na altura, ou nesse passado, fazia sentido!